UMA NOVA FRONTEIRA DA CANA

Chegada da multinacional Bunge, em parceria com a japonesa Itochu, movimenta a pequena Pedro Afonso, no Tocantins.
Nos últimos meses, a pacata Pedro Afonso, no interior do Tocantins, foi invadida por um batalhão de profissionais. São engenheiros, agrônomos e biólogos, além de representantes de países como Estados Unidos e Japão. A movimentação ganhou as ruas do município de apenas 10 mil habitantes, que não falam em outra coisa a não ser no investimento bilionário da multinacional Bunge, em parceria com a japonesa Itochu.
As duas empresas escolheram o Estado para iniciar uma nova fronteira da cana-de-açúcar. O projeto começará com 10 mil hectares de área plantada e 1,4 milhão de toneladas de cana produzida por ano. A construção da usina já está na fase final e deve ser concluída nos próximos meses.
Embora a empresa não confirme o valor do investimento, o número que circula nas rodas de negócios em Pedro Afonso é de R$ 1,5 bilhão, 12 vezes o Produto Interno Bruto (PIB) da cidade em 2007, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com tanto dinheiro e gente nova, o município sentiu a falta de infraestrutura, conta a moradora Eliane Ferreira dos Santos.
“Hoje, todos os hotéis da cidade estão ocupados com funcionários da Bunge. O sistema de água também não tem aguentado tamanha demanda”, destaca ela, que cresceu ouvindo falar de duas grandes obras: a Ferrovia Norte-Sul e a ponte sobre o Tocantins. Depois de muita descrença, a ponte foi inaugurada, aposentando o sistema de balsa.
Eliane lembra que, no passado, a cidade sobrevivia do dinheiro público. Os únicos empregos eram na prefeitura, nos bancos e nos órgãos estaduais. Hoje, diz ela, que toma conta de um restaurante na entrada da cidade, tudo mudou. “Primeiro veio a soja, que deu emprego para muita gente; agora, a maior atração da cidade é a cana.”
Segundo Adalgiso Telles, diretor da Bunge, a usina começará a operar com mil empregos diretos, chegando a 1,4 mil quando atingir a capacidade máxima, nos próximos quatro anos. O executivo explica que, além do solo e do clima, a companhia escolheu a região por causa das vantagens logísticas. Recentemente, a multinacional firmou contrato com a Vale para transportar etanol pela Norte-Sul até o Porto de Itaqui.
Como a Bunge, outras empresas também enxergaram os benefícios de Tocantins. De área perdida para a economia brasileira, o Estado virou território cobiçado por investidores nacionais e estrangeiros do agronegócio. Em dez anos, teve a maior taxa de crescimento no cultivo de grãos do País, com avanço de 126% da área plantada, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Embora ainda esteja distante dos vizinhos Mato Grosso e Goiás, a região começa a ser percebida no cenário nacional. Seja ao longo da BR-153 (Belém-Brasília) ou das estradas vicinais, imensos campos de soja se estendem por quilômetros e mudam a paisagem da região.
O diretor-presidente da Cooperativa Agroindustrial do Tocantins, com sede em Pedro Afonso, Ricardo Benedito Khouri, acredita que o local vai crescer ainda mais com a chegada da Bunge. A expectativa, diz ele, é a cana-de-açúcar empurrar a soja que hoje ocupa a região de Pedro Afonso para outras áreas no Tocantins. Isso porque a cana tem de ficar mais próxima da unidade produtora. “Cheguei ao Estado em 1996 e vi a agricultura se desenvolver aqui. Nos últimos anos, grandes corporações de todo o mundo desembarcaram na região.”
Hoje, são essas empresas que estimulam os produtores locais, migrantes de outros Estados. É o caso do ex-piloto de automobilismo Ademir Barcante. Em 2003, ele trocou sua cidade no interior do Paraná e o emprego em multinacional para ser produtor de soja no Tocantins. “Quando decidi ser agricultor, saí à procura do melhor local para me instalar.”
Ele conta que, antes de se aventurar em busca de áreas para plantar, definiu alguns pontos que o local deveria atender: nível pluviométrico, preço da terra, topografia, fertilidade do solo, qualidade de vida e logística. O Estado do Tocantins se enquadrou em todos os requisitos, conta ele. Hoje, o ex-piloto tem 1,5 mil hectares de área plantada na região de Itapiratins, a 255 km de Palmas (O Estado de S.Paulo, 14/3/10)